A minha expectativa para Montepulciano era enorme. Diria até gigante. É que numa só cidade reúnem-se várias coisas que aprecio: património histórico, gastronomia e vinhos.
À semelhança do que aconteceu em quase todas as cidades da Toscana, foi ao fim da tarde que cheguei a Montepulciano. Estacionei "la maquina" à porta do hotel (era assim que o dono lhe chamava), uma vantagem dada a quem de fora pernoita dentro das muralhas. Como já caía a noite, não perdi muito tempo. Abri apenas as malas e saí. Alguns casais procuravam um espaço para jantar e tal como eu, dirigiram-se para La Bottega del Nobile, um restaurante, wine-bar e loja de vinhos com mais de 300 referências toscanas. A casa estava quase cheia mas consegui mesa, apesar de não ter marcação. O serviço foi rápido e simpático e escolhi o que me tinham recomendado como imperdível: tábua de queijos e enchidos, picci e carne grelhada com molho balsâmico.
Mas só na manhã seguinte, após me despedir do meu anfitrião, família e os três cães, pude realmente ver Montepulciano. Àquela hora, as ruas estavam praticamente desertas. Apenas os hóspedes alojados que tinham de retirar os carros circulavam.
Um dos motivos que queria muito percorrer as ruas era para encontrar os lugares onde foi filmada a série “Os Médici” que tinha religiosamente acompanhado na RTP. Por isso fui procurar o miradouro onde se pode observar, além da magnífica paisagem toscana, o Tempio di San Biagio. O casario assemelha-se a San Gimignano, com os seus telhados repletos de antenas parabólicas e clarabóias.
Como o Museo Civico Pinacoteca Crociani estava ainda encerrado, subi até à Piazza Grande onde espera encontrar o cartão postal. De facto, ele estava lá, mas camuflado e interdito. Em vez de encontrar um centro histórico pacato e arranjado, encontrei uma praça vedada, coberta de terra, onde já se preparavam novas gravações. Apesar da confusão, pude apenas ver a fachada do Duomo (que também se encontrava encerrado) e o Pozzo dei Griffi e dei Leoni com a bonita arquitrave com o brasão da família Médici.
Desci até à Via del Corso, das ruas mais movimentadas, muito em parte devido ao comércio. Além das lojas de vinho e massas secas, há também ourivesarias com peças de inspiração etrusca, artigos em pele e cobre. Vi também alguns dos seus monumentos, como a Porta al Prato, Colonna del Marzocco, o Palazzo Bucelli cuja fachada conserva urnas funerárias e as igrejas de Sant ‘Agostino e de San Francesco. Vale a pena entrar no Caffè Poliziano que conserva ainda o seu ambiente histórico e oferece uma vista fabulosa sobre a Toscana.
Mas Montepulciano é sobretudo conhecido pelos seus vinhos e adegas. A Cantina Fattoria della Talosa foi das que mais gostei. Fica entre dois antigos palácios, o Tarugi e o Sinatti e para chegar à sua adega que remonta ao século XVI é necessário descer muito. As escadas são estreitas, os corredores também mas o esforço compensa. Em visita guiada ou livre é possível circular entre os enormes barris de carvalho onde estagiam o Vino Nobile di Montepulciano e o Vino Nobile Reserva.
A família Contucci produz vinho há vários séculos e é considerada uma das fundadoras do “Vino Nobile”. A adega está localizada num palácio do século XIII construído por Antonio Sangallo. É possível fazer visitas guiadas com provas comentadas mas também se pode entrar livremente e percorrer os vários pisos repletos de barricas onde o vinho envelhece ao seu ritmo.
Se aqui se fomenta o silêncio e um ambiente recatado, na Cantina Ercolani é o oposto. A exposição de garrafas e produtos para venda começa fora de portas, incluindo o aliciamento por parte de funcionários para entrarmos. É que isto é mais uma loja do que propriamente uma adega. Aqui vende-se, além de vinho, azeite, queijo, massas, trufas. Ainda assim, percorri os vários pisos por corredores estreitos e escuros à procura da tumba etrusca.
Mas não podia deixar Montepulciano sem conhecer uma loja de vinhos mais em pormenor. Entrei na Enoteca Borgo di Vino. Talvez por estar deserta, o atendimento foi excelente. Fizeram-me uma visita pela loja e explicaram-me os vários tipos de vinhos da região e produtores de referência: Poliziano, Avignonesi, Boscarelli e Antinori.
Foi exatamente a adega deste último que me recomendaram visitar. Eu, que há dias atrás tinha ficado assoberbada com o projeto Antinori nel Chianti Classico achei que seria uma boa opção. Peguei no telefone, marquei e pouco tempo depois estava a iniciar a visita.
Se não fossem as vinhas, diria que estava numa hacienda da América Central devido à arquitetura do edifício. Mas ao atravessar as vinhas a imagem muda completamente: a paisagem é genuinamente toscana.
Esta adega tem uma localização especial entre duas grandes regiões produtoras de vinho: Montepulciano e Cortona. E isso revelou-se nos vinhos que estiveram em prova.
Iniciou-se com um Achelo 2015, Cortona DOC 100 % Syrah, um vinho muito fresco e leve.
Seguiu-se um Vino Nobile di Montepulciano 2014 feito a partir das castas Prugnolo Gentile (também conhecida por Sangiovese) e Merlot, um vinho igualmente frutado. Estagiou um ano em barrica e um ano em garrafa, o que lhe confere outra estrutura.
Para terminar, um Bramasole 2012 Cortona DOC 100% Syrah, um vinho mais complexo em termos de cor, aroma e estrutura, muito encorpado e quase sem acidez.
0 comentários:
Enviar um comentário