Sempre que viajo procuro algo de inspiração portuguesa no destino, seja um azulejo Viúva Lamego em Havana, uma estátua em mármore de Estremoz em Plasencia ou um quadro de um pintor português em Lyon. Em Nova Iorque esse encontro deu-se no Aldea, o estrelado restaurante do luso-americano chef George Mendes.
Ele há coisas do destino… Qual a probabilidade de ir a Nova Iorque e jantar num restaurante cujo chef é quase meu conterrâneo? Apesar de George Mendes ter nascido nos Estados Unidos da América, os seus pais são de Ferreirós do Dão, uma freguesia do concelho de Tondela, a minha terra natal.
Deveria começar por contar como o Aldea está bem localizado, como a decoração é intimista, como a sua cozinha de inspiração portuguesa tem cativado cada vez mais pessoas. Deveria começar pela experiência gastronómica mas prefiro dar primazia ao lado humano.
Conheço o chef George Mendes quase no fim do serviço. Foi uma noite intensa, com o restaurante praticamente cheio no piso térreo e um evento privado no piso superior. O aperto de mão é vigoroso e quente, talvez porque durante toda a noite estes dois instrumentos de trabalho não tiveram descanso. O chef não é daqueles que apenas finaliza os pratos. Trabalha mais do que qualquer um dos seus colaboradores e todos sabemos que quando se chega a um determinado patamar, isso nem sempre acontece. O sorriso é simples mas cativante. Falamos da próxima viagem a Tondela, de como tem mesmo de conhecer a Mesa de Lemos, do projeto Aldea, de como a primavera tarda a chegar a Nova Iorque. Agradeço ao chef a noite fantástica que passei no balcão do Aldea, mesmo em frente à cozinha onde a magia acontece.
É importante começar por dizer que o Aldea não é um restaurante de comida portuguesa mas de inspiração portuguesa. Por isso, que ninguém vá ao engano de esperar um arroz de pato típico. O chef George Mendes dá-lhe a sua interpretação.
A carta está dividido em quatro partes, havendo a possibilidade de menú de degustação com serviço de vinhos ou então pode-se escolher à carta. Eu optei por esta. Apesar de ter comido muito bem em Nova Iorque e em momento algum ter saudades da nossa comida, quis escolher o que mais se aproximasse à “cozinha portuguesa”.
Começaram a chegar à mesa as boas-vindas do chef mas cuja descrição (que foi dada antes de todos os pratos), acabou por ficar perdida um pouco no meio de ruído. Mas gostei em particular da segunda, muito fresca.
Do primeiro curso experimentei dois pratos: os espargos brancos, servidos com caranguejo e amêndoa.
Mas o bacalhau à brás tinha-me saltado à vista. É importante destacar o trabalho meticuloso com que tudo é colocado no pratos, em especial a enorme atenção que é dada às ervas aromáticas. Estão tapadas e refrigeradas, apenas retiradas no momento de finalizar o prato.
Passei diretamente para os pratos principais. Comecei com umas vieiras servidas com foie gras, nabos japoneses fermentados, alho porro selvagem e um jus de galinha que estava divinal. Quando estava a ver o chef George Mendes a grelhar as vieiras nunca imaginaria que seria o prato do noite.
Mas estava com uma enorme expectativa para o arroz de pato. Já tinha visto imagens e sabia que não era como o nosso. E mais uma vez foi uma explosão de sabor. O arroz, o pato confitado, o chouriço, a azeitona preta, a essência de laranja e por cima uns torresmos mesmo crocantes.
Quanto ao serviço de vinhos a copo, há referências do Alentejo, Dão e Douro, tendo optado por um Niepoort "Redoma" tinto 2014.
Ficar no balcão do Aldea é dos melhores lugares para quem aprecia o trabalho de cozinha. Ver a preparação dos pratos, o empratamento, a finalização e o serviço, como se de um bailado altamente coordenado se tratasse. Há um enorme espírito de entreajuda (quando um está mais livre ajuda o outro) e todos sabem quando entrar e sair. Ser chef está na moda mas não tenhamos ilusões de que o trabalho na cozinha é muito duro.
Nas sobremesas voltamos aos sabores portugueses, se bem que não podia deixar de provar a mousse de chocolate de avelã. Eu, que não sou uma fã de banana, achei que o gelado e banana caramelizada contrastavam muito bem, assim como o curd de calamondin.
Os pastéis de nata recordaram-me Portugal (ainda que a consistência do creme seja ligeiramente diferente) mas os sonhos, quentinhos, com creme de caramelo salgado e maracujá apontam para a velha máxima: o Natal é quando o Homem quiser.
–Quer que embrulhe estes para um lanche mais tardio?–perguntam-me com um sorriso.
É que é mesmo impossível resistir-lhes.
A equipa do Aldea é incansável. Além da explicação minuciosa de cada prato, há a preocupação em acompanhar o decorrer do jantar e avaliar a satisfação do cliente.
–Enjoy your dinner.–é das frases mais ouvidas nas várias mesas.
Nessa noite fui a pé para o hotel. Talvez por ir de coração cheio, por a noite ter sido extraordinária, até parecia que o frio era menor. Continuava a pensar na probabilidade de voltar a encontrar o chef George Mendes. Talvez numa outra “aldea”, em Tondela, numa próxima visita a Portugal.
Aldea
31 W 17th st,
New York, New York, 10011
(between 5th and 6th ave.)
www.aldearestaurant.com
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