Foi durante um almoço que ouvi falar pela primeira vez na Lusovini. Que a antiga Adega Cooperativa de Nelas já não era a mesma, que o espaço estava muito bonito e que o restaurante merecia a dispensa de algumas horas para conhecer os sabores beirões. Perante tão emotiva sugestão, agendei uma visita guiada e almoço na Taberna da Adega.
Do que menos gostava dos invernos na Beira era dos dias de chuva. É que além da maçada de andar na rua e ficar toda molhada, era aquele monocronismo da paisagem. Céu, pedra, pinheiros e urzes pareciam todos semelhantes: cinzentos. É num dia como este que visito a Lusovini, com a agravante de um nevoeiro que muito de mansinho se vai instalando para ficar. Mas o desconforto do tempo dissipa-se por completo assim que cruzo as portas. A recepção é um espaço amplo que dá acesso a várias áreas: zona de visita, loja e restaurante. É a Rita de Serpa Barata quem me recebe e após me ser servido um welcome-drink, um Palavrar Espumante Bruto, da Bairrada, seguimos para almoço na Taberna da Adega.
Num dia de frio como este, sentir o calor da lareira foi verdadeiramente reconfortante. Eu, que penso que até cheguei cedo, dou com algumas mesas já completas. Em breve o restaurante estará completamente cheio. À frente da cozinha desde Setembro está o chef António Batista, que conheci durante a minha estada na Madre d’Água.
A Taberna da Adega, embora esteja inserida no espaço da Lusovini, é pertença da Lusodux, resultante de uma parceria com a Lusovini com o Grupo Dux. Mais do que um restaurante, pretende ser um espaço gastronómico descontraído, de harmonização das criações do chef, homem da terra e conhecedor dos produtos locais, com os vinhos produzidos na casa. Sendo que a Lusovini tem vinhas em várias regiões do país, as possibilidades são imensas. Há por isso um trabalho de equipa entre o chef e Paulo Borges, chefe de sala, que ajuda os clientes na experiência que procuram.
E a minha começou com umas vieiras salteadas com puré de ervilha que acompanhei com o espumante Palavrar.
Seguiu-se um bacalhau fresco com batata que foi harmonizado com um Pedra Cancela Branco Reserva 2015, feito a partir das castas Malvasia Fina e Encruzado.
Veio depois o cabrito assado com batata e grelos, servido numa taça de barro preto de Molelos, que conheço tão bem. Foi sugerido acompanhar com um Pedra Cancela Reserva Tinto 2014. Eu, que ainda tinha algumas provas para fazer, declinei, mas o Paulo insistiu que seria mesmo pena não experimentar e aceitei. E que tremenda perda teria sido. Este foi dos vinhos que mais gostei de provar em 2017. Os vinhos Pedra Cancela são dos mais conhecidos do Dão, produzidos por João Paulo Gouveia, um dos administradores da Lusovini.
Como pré-sobremesa experimentei pela primeira vez o Cambridge Ice, fruto da parceria entre a Lusovini e a Andresen. Feito a partir das castas Malvasia Fina, Codega, Rabigato, Moscatel e Viosinho, foi servido com uma bola de gelado, que juntamente com um toque de lúcia-lima lhe quebrou o excesso de doçura.
E como sobremesa veio um creme queimado de encruzado com avelã, um dos meus frutos de eleição e tão difícil de encontrar num restaurante.
Após um almoço que já ia longo, foi tempo de regressar à recepção e iniciar a visita ao espaço. É junto do grande mapa do Dão que começam a ser dadas as primeiras contextualizações. E é aqui que constato uma realidade tão evidente mas de que nunca tive consciência: Nelas está no coração do Dão e esta região demarcada tem características muito próprias. Primeiro está rodeada de serras (Estrela, Caramulo, Buçaco e Lousã) que ajudam a proteger as vinhas dos ventos; depois é atravessada por dois rios ( Mondego e Dão); tem várias altitudes e os solos são predominantemente graníticos.
Dada esta explicação introdutória, avanço então para conhecer o espaço. Não se sabe ao certo o ano de construção da antiga Adega Cooperativa de Nelas (estima-se que entre 1950 e 1970) mas na altura já houve preocupação com o armazenamento, arejamento e temperatura.
Nas paredes encontram-se alguns painéis de azulejos com réplicas de fotografias de Domingos Alvão encomendadas durante o Estado Novo com o intuito de “desmistificar” a ideia de que em Portugal existia pobreza. Assim, aparecem em várias cenas pessoas a trabalhar no campo com o seu traje domingueiro e calçados. A máxima que sempre ouvi aplica-se bem aqui: “Pobrezinhos mas limpinhos”.
Na sala seguinte encontram-se os alambiques que já pertenciam à antiga Adega Cooperativa de Nelas para destilação de aguardentes. Não parece que seja um opção da atual administração da Lusovini, no entanto, além do valor patrimonial e monetário, embelezam este espaço destinado agora a sala de provas, formação e workshops.
Seguimos para as sala de estágio de vinhos e espumantes. No ano passado foi lançada a primeira pedra da futura adega de espumantes no Dão, fruto da boa aceitação dos dois espumantes Lusovini no mercado: o Pedra Cancela Bruto e a edição limitada da Comemoração dos 30 anos de carreira do Eng. Casimiro Gomes.
É no primeiro andar de cubas que me começo a aperceber das particularidades de vinificação do edifício. Existem cerca de 100 cubas com capacidade entre os 75 e 1500 hectolitros. Após a aquisição do edifício pela Lusovini houve a preocupação em revestí-las de forma a obter-se uma correta higienização e posterior armazenamento dos vinhos nas melhores condições.
Os vinhos de topo são feitos em barricas de carvalho francês, com fermentações naturais, sem controlo de temperatura, como se fazia antigamente no Dão. Recupera-se, desta forma, a genuinidade desta região, procurando-se obter vinhos de guarda e de elevada qualidade.
Na loja há sempre vinhos em prova, geralmente entradas de gama de cada região. Quem visita o espaço pode conhecer estes vinhos e comprá-los de forma consciente. Está dividida por regiões: Dão, Bairrada e Douro, Alentejo e Portos. Aqui pode-se encontrar os vários vinhos produzidos pela Lusovini, como o Varanda da Serra, Pedra Cancela, Sericaia, Tapada do Coronel, Aplauso ou Flor de Viseu.
Já é noite quando me despeço da Rita de Serpa Barata. Uma anfitriã nata e excelente contadora de histórias. O Dão está de boa saúde e recomenda-se.
Lusovini Vinhos de Portugal
Avenida da Liberdade, nº 15, Areal
3520-061 Nelas
www.lusovini.com
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